quinta-feira, 28 de maio de 2009

"Os discursos habitam corpos" - experimento proposto por Evie Souto

A PROPOSIÇÃO


A concepção binária e naturalizada da humanidade é uma disposição do mundo moderno. Ser sexuado é estar submetido a um conjunto de regulações sociais situado como principio formador do sexo, gênero e desejo.

As danças de salão são configurações binárias em suas coreografias e discursos. Tradicionalmente executadas por duas pessoas do sexo oposto, onde pertence ao homem o poder de decidir sobre a seqüência de movimentos, sua forma rítmica, direção e velocidade de deslocamento. A mulher deve estar apta a compreender as solicitações do seu parceiro, desenvolvendo os movimentos correspondentes.

O formalismo glamoroso das regras de etiquetas tem preservado a erotização da dominação masculina e as hierarquias de gênero nas danças de salão. Romper e construir novos significados para os gêneros, deslocar a sexualidade da matriz heterossexual é estar em risco.

Para a Teoria Queer, o socialmente real é criado por atos de repetição dos sujeitos, concebidos como efeito de uma multiplicidade de processos de socialização, onde obtêm a sua condição "masculina" ou "feminina" como produtos histórico-sociais.

A palavra queer designa algo ou alguém desestabilizador da ordem social estabelecida. Esta pesquisa propõe investigar as estratégias binárias nas coreografias e discursos das danças de salão que criam e sustentam seu modelo masculinista e heteronormativo de poder, buscando frestas para desestabilizá-lo.

O EXPERIMENTO

1. Alongamento livre (10’)
2. Distribuição dos discursos aos participantes, solicitando sigilo absoluto sobre o conteúdo dos mesmos (5’);
3. Exibição de vídeo sem áudio editado com trechos de coreografias de forró, tango, mambo, lambazouk, bolero e samba de gafieira para observação das estratégias coreográficas utilizadas (15’);
4. Experimentação coreográfica dos discursos: iniciar caminhando individualmente pela sala. Ao comando DUPLA formar um par e improvisar uma dança a dois, considerando o discurso recebido. Ao comando SOLO voltar a caminhar individualmente pela sala. Promover troca de duplas até que todos dancem com todos, se possível (25’);
5. Para cada participante solicitar a opinião do grupo sobre como foi dançar com ele(a) e especular sobre qual seria o seu discurso e as estratégias coreográficas utilizadas por ele(a). Após opinião do grupo o participante revela o discurso recebido e os recursos coreográficos escolhidos para representá-lo (tempo máximo estimado 35’).
6. Leitura dos trechos para reflexão e abertura das discussões em grupo (até 40’).

OS DISCURSOS

Foram selecionados 17 discursos coletados de falas verídicas de praticantes das danças de salão durante festas em Salvador, havendo sofrido pequenas adaptações para melhor compreensão dos mesmos. Das quatorze pessoas presentes, doze dançaram e dois observaram (Fernandinho e Natália Rosa). Seguem abaixo os discursos na íntegra e seus respectivos intérpretes:

1. Inicialmente me deixo conduzir. Entretanto, fico atento aos momentos propícios para roubar a condução sem aviso prévio, devolvendo-a quando estiver satisfeito e ver como o outro reage a este “imprevisto”. (Alana)
2. Nas danças de salão a condução sempre pertenceu ao homem e é assim que deve continuar sendo. Mulher que se mete a conduzir na dança é porque quer dar uma de homem. (Diego)
3. A mulher no baile é uma espécie de rainha, de diva: joga o cabelo, insinua-se, provoca. O homem pode responder com um atrevido avanço de quadril. A ousadia é a marca do macho; mostrar poder e dominar a cena é a da fêmea.(Simone)
4. Só me deixo conduzir por homens ou por mulheres vestidas de homens. (Mayana)
5. Só conduzo mulheres, pois se tentar conduzir um homem e der errado e a culpa vai ser minha. (Maria Paula)
6. A idéia de ser conduzido o tempo todo por alguém de forma silenciosa, sem ter direito de propor também o que eu tenho vontade me oprime. Me sinto usado. (Joélia)
7. Exijo que pessoa que estiver dançando comigo esteja atento às minhas vontades. Caso contrário encontro uma maneira discreta de sabotar a dança para que meu par se sinta culpado pelo erro que eu provoquei. (Ana Flávia)
8. Nas danças de salão o homem, por mais gay que ele seja, não deve ficar inventando muita coisa: nada de rebolar muito, desmunhecar, jogar cabelo...Seu papel é se manter firme para que a mulher não se desoriente. (Victor)
9. Tem movimentos que são exclusivamente femininos. Quando um homem tenta fazê-los fica meio gay, parece que quer competir com a mulher para ver quem aparece mais. (Joline)
10. Na dança de salão, o homem tem uma série de obrigações, como cuidar da mulher, planejar o rumo, variar os passos, segurar com firmeza e orientar delicadamente o corpo de uma mulher. A mulher fica mais livre para desfrutar o baile, basta escolher um bom parceiro que a faça brilhar. (Antrifo)
11. Mesmo sendo homossexual não sinto falta de dançar alguém do mesmo sexo que eu, pois gosto é da junção de dois corpos diferentes para uma proposição. (André)
12. Nas danças de salão existe um dialogo aonde um conduz e o outro permite essa condução, contando que seja definido antes quem vai conduzir quem. (João Miguel)


OBSERVAÇÕES

Este experimento estava previsto para acontecer no dia 18/05. Mas, devido às fortes chuvas que assolaram a cidade, aconteceu no dia 25/05, após do de Joline. Dessa forma, achei não haver necessidade de novo alongamento e iniciei com a distribuição dos discursos. Embora solicitado silêncio durante a exibição do vídeo, a concentração foi quebrada algumas vezes pelo grupo, provavelmente devido a agitação do laboratório anterior.

Durante a experimentação coreográfica em duplas pode observar a utilização de alguns movimentos exibidos no vídeo. Atribuo o estado de agitação dos participantes-dançantes à agitação do experimento anterior, pois na maior parte do tempo pareciam estabelecer uma relação de conflito ao invés de parceria. Devido à preocupação com o tempo, não foi possível todos dançarem com todos.

Na etapa seguinte formou-se uma roda, e elegi um integrante, perguntando ao grupo como foi dançar essa pessoa, se era possível deduzir qual o discurso que havia recebido. Após as opiniões do grupo, o participante em questão lia em voz alta o discurso recebido. Um a um os participantes-dançarinos foram avaliados pelo grupo e revelando seus discursos. Ainda em rodoa li os trechos que selecionei da minha pesquisa bibliográfica e lancei a pergunta “Quais brechas poderiam ser utilizadas para desestabilizar a hierarquia de poder no contexto das danças de salão?

Avalio o experimento como satisfatório, apesar de resultados inesperados como a aparente rivalidade entre as duplas. Observei ainda que algumas pessoas não conseguiram agir conforme de acordo com o discurso recebido, imagino que devido á grandes diferença entre este e o seu próprio. A relação discurso verbal e coreográfico não foi investigada de forma satisfatória tanto pela escassez de tempo como pelo direcionamento dado por mim. A leitura dos trechos poderia ter sido suprimida, visto que não devem ter feito muito sentido para mais ninguém do grupo além de mim.

domingo, 3 de maio de 2009

RELATÓRIO DE PRÁTICA proposta por Ana Flávia – dia 15/04/09

RELATÓRIO DE LABORATÓRIO - DIA 15/04



A PESQUISA


Tema - "Batom vermelho não!"


Proposta de investigação - Estudo do estereótipo feminino na Igreja Assembléia de Deus e sua produção de signos. O presente laboratório trabalhou com a perspectiva do signo comumente visto na figura mulher asembleiana que é a saia longa e os mecanismos de locomoção e burlação das limitações/possibilidades oferecidas por este elemento.




A presente proposta surgiu de uma inquetação durante a seguinte circunstância: Ao se arrumar para apresentação de uma coreografia na Igreja Batista dos Mares cuja a temática do trabalho era dança flamenca as integrantes do Grupo Karisma se mostraram resistentes a idéia de usar batom vermelho por julgarem o mesmo "vulgar". Esta resistência ao batom me fez refletir que outros signos são entendidos ou não por vulgar e em que espaço se dá esta construção no imaginário coletivo.


Para tal observação, passei a listar alguns elementos que mulheres da Igreja Asembléia de Deus usam tipicamente fazendo uma breve ressalva de que o segmento doutrinário da Assembléia de Deus mencionado neste estudo seria de uma linha mais tradicional haja vista que a doutrina evangélica tem passado por uma série de mudanças em suas configurações originárias do calvinismo e luteranismo para atender a uma série de demandas cada vez mais complexas e distintas.


O estereótipo da mulher selecionada para estudo usa saia longa, cabelos presos em conque ou trança, não faz uso de maquiagem ou bijuterias mais chamativas ou qualquer tipo de apelo que venha a chamar a atenção para si.


O LABORATÓRIO


O laboratório fez uso de um único signo dentre o universo de elementos oferecidos por este estereótipo que foi a saia comprida, por esta ser um elemento facilmente reconhecido na figura feminina da Igreja Assembléia de Deus.


Para sistematizar o laboratório foi segmentado em seis partes nas quais foram sendo apresentadas paulatinamente as etapas da proposta que iam se complementando passo a passo. Segue abaixo a descrição de cada parte do laboratório, seguido de trecho em vídeo ou link do youtube em virtude da extensão do arquivo que não coube no blog.


Parte I

Foi solicitado ao grupo a realização de um livre aquecimento na barra a fim de preparar o corpo de forma individualizada seguindo as necessicidades de cada um para a proposta seguinte.


Parte II
Cada um deveria criar uma partitura coreográfica de oito tempos livremente.
http://www.youtube.com/watch?v=F9LOu2jEQNA


Parte III
Fazendo uso dessa partitura coreográfica, cada integrante deveria vestir a saia e adaptar a partitura a este novo elemento e apresentá-la individualmente.
http://www.youtube.com/watch?v=vBknIvyt_sE


Parte IV
Uma vez adaptada a saia, esta partitura deveria ser modificada sob a seguinte condição: NÃO EXPOR MEMBROS INFERIORES ALÉM DOS PÉS.Uma vez adaptda a partitura deveria ser novamente apreciada.
http://www.youtube.com/watch?v=gc_puwv-oA0


Parte V
A partir desta construção os integrantes deveriam atribuir segundo o entedimento pessoal aspectos sensualizantes a esta partitura.
http://www.youtube.com/watch?v=Ds2fiQ15bjM&feature=channel


Parte VI
Findado o processo o grupo reuniu-se para comentar o laboratório e oferecer um feed back a respeito.

OBSERVAÇÕES

O presente laboratório permitiu observar alguns aspectos e consolidá-los com informações previamente articuladas em campo observando mulheres assembleianas durante cultos.
Primeiramente pode se observar o estabelecimento de um relacionamento entre o ser e o objeto em ambas as circunstâncias sendo que enquanto a mulher da Assembléia de Deus busca minimizar o quanto possível os movimentos da saia, seja em seus passos curtos, na ausência de gingado nos quadris ou no cruzar de pernas, os corpos do laboratório buscaram criar o maior número de movimentos possíveis à saia.
Uma vez proposto condições próprias do cotidiano dessas mulheres como a limitação em não expor membros inferiores foi notória a idéia de limite. A partir dessa perspectiva as partituras coreográficas sofreram recortes, ficando limitadas aos membros superiores e perdendo movimentos antes usados frente a esta nova possibilidade.
Por fim ao solicitar que estas partituras recebessem caracteres sensualizantes ainda sob a proposta de não expor membros inferiores nova informação se cruzou com a realidade de campo: as expressões faciais tem legitimidade nesses espaços em que outras partes do corpo não são contempladas.
Findado o laboratório os comentários suscitados em grupo reforçaram as observações realizadas ao longo do laboratório permitindo dizer que cada mecanismo de limitação estimula novas possibilidades que levem a burlar este sistema o que permite tirar o fardo do estereótipo estudado ser somente um mero agente passivo de sua realidade e lhe percebendo como atriz e autora de mecanismos próprios de afirmação de sua condição sexual.

O outro

Olá pessoal!

Segue abaixo texto e link do vídeo no youtube do poema de Mário de Sá Carneiro musicado por Adriana Calcanhoto chamado "O outro" mencionado no laboratório de Diego no último dia 27/04 - Segunda-Feira.

Bjos
Ana

http://www.youtube.com/watch?v=CHwPgxTIK5E


O Outro

Eu não sou eu,
Nem sou o outro
Sou qualquer coisa de intermédio
Pilar da ponte de tédio
Que vai de mim para o outro

RELATÓRIO DE PRÁTICA proposta por Alana – dia 22/04/09










































































































RELATÓRIO DE PRÁTICA – dia 22/04/09

(Devido à impossibilidade de levar-se os materiais tecnológicos necessários num dia de muita chuva na cidade, este laboratório não contará com uma produção posterior de DVD, já que não pôde ser filmado.)

Sobre o formato

O laboratório proposto por mim, Alana falcão, consistiu num extenso compartilhamento teórico que precedeu a proposição de experiências preparatórias para a composição coreográfica.Apostei num aprofundamento do tema como estratégia problematizadora das questões no corpo para a cena.

Sobre o seminário

O tema “mulher e sertão” foram tratados da seguinte maneira:
· Justificativa: meus interesses autobiográficos em brasilidade (ou na construção desta) analisados a partir de minhas relações de parentesco. Neste caso específico, a figura de minha avó, sertaneja, rezadeira. É de interesse legítimo, observar como a cultura está sempre transformando estas relações, que desde sempre estão imersas naquela.
· A invenção do nordeste: passando por alguma breve fundamentação histórica, destaco os discursos (e seus interesses) que compõem a noção de sertão e sua justaposição ao termo nordeste, desde os primevos relatos médico-sanitaristas em seu caráter etnográfico não flagrado, e a substituição deste discurso higienista por um discurso sociológico implementado pelos intelectuais da elite nacional interessadíssimos na pintura de algo “genuinamente tupiniquim”,a fim de se legitimar como aristocracia local e afastar-se dos modelos colonizadores, europeus e norte americanos.
·
* Vimos anteriormente que nas primeiras viagens pelo interior do nordeste, nas primeiras décadas pós instauração da república, nas descrições por serem relatos médicos, imperava uma semiologia médica pretensamente objetivista que referia-se ao sertão como espaço físico claro e delimitado, naturalizando o termo, desconsiderada portanto, sua gênese e a alta carga simbólica a ele associada.

Nação e Narração: a partir das premissas de Eric Hobsbawn e Homi Bhabba, discutimos o caráter performativo da construção de Nação. Para o último, há um desejo comum a todos de indicar e compreender configurações de localidade e temporalidade da nação. E esta é uma invenção, uma criação social tecida por narrativas. A narrativa portanto é a estratégia de construção de sentido para que tenhamos essa noção de compartilhamento de geografia e tradições (chamada por ele de geografia imaginada) e tais estratégias linguísticas compõem-se de imagens, panoramas e cenários, os quais procuram estabelecer uma experiência de pertencimento coletivo, realçando uma “origem comum”. No caso do Brasil, essas configurações desenharam uma categoria de espaço*, o sertão, como forma principal de falar, definir e delimitar a nação. O projeto de nação no Brasil tem como fundamento a territorialidade. Encantado com a imensidão territorial ou atormentado pela existência de gigantescos vazios, a imaginação social se volta para o sertão ora como problema a ser solucionado, ora como índice de brasilidade. Estabelecido como categoria central no processo de invenção do Brasil, o sertão se configura no “signo da nação incabada”.
· O sertão e suas representações: constituiu-se em rápida análise das representações sertanejas. Na literatura pode –se observar Jeca Tatu de Monteiro Lobato, “ Os sertões” de Euclides da Cunha, “Vidas Secas” de Graciliano Ramos e a obra de Guimarães Rosa, como um todo. No cinema há o icônico “Deus e o diabo na terra do sol” de Glauber Rocha numa produção mais polifônica, intertextual, há também “Abril despedaçado”, “O céu de Suely” de Karim Ainouiz, “Central do Brasil” de Walter Salles e “Baixio das Bestas” de Cláudio Assis. Na dança encontrei “Bull dancing – o urro do Omi boi” de Marcelo Evelin, além de “Baque” da cia. De danças de Diadema. Dessas representações emergem de forma geral imagens que o sertão evoca no imaginário coletivo; ele está relacionado a um “ nós” arcaico, primitivo, e por isso talvez, tido como nosso pedaço de origem (principalmente, por se achar intocado, em relação aos colonizadores); ensejando imagens de deserto, de vazio, com um tempo dissonante do tempo cotidiano da urbes. O sertão como o nosso elo primitivo, como objeto de desejo, fantasia de lugar e origem, ora como sítio distante,atrasado e incivilizado, terra desolada ou paraíso perdido.
Só a título de esclarecimentos, o espetáculo Bull Dancing – o urro do Omi boi, trata do auto do boi-bumbá, que tradicionalmente narra a história de Catirina,grávida de um filho que nunca nasce, deseja comer a língua do boi. Importante atentar para um detalhe descoberto depois: com quase dois séculos de existência, o auto do boi até pouquíssimo tempo atrás não contava com a presença de mulheres, até a própria Catirina era feita por homens “montados”, já que “mulher não podia virar boi”. Neste trabalho a emergem questões nunca abordadas quando o assunto é “de raiz”, como a sexualidade ou o desejo, por exemplo, nos faz ver que a cultura popular pode muito mais do que o que habitualmente se faz em seu nome. O bumba-meu-boi passa a ser tratado como uma metáfora da vida em sociedade. Humanos-bois, omi boi, boi/humanos-aos-pedaços - são várias as aproximações propostas, trata inclusive das posições sociais da mulher nesse universo.
Elenquei previamente dentro do campo imagético sertanejo algumas palavras para guiarem o laboratório, foram elas: gado morto, terra rachada,chão, ossos de bois, beatas, cangaço, messianismo, seca, lata d´água na cabeça, narração, calor.

Proposição cênica 1descrição de procedimentos

Dei muito crédito à maneira que os laboratórios anteriores estabeleceram suas conexões a partir de uma tal “seqüência prévia que cada pessoa, por ventura já possua” e desta, advirem as transformações. Este modus operandi, que de antemão considera o repertório pessoal me garantiria de partida, uma diversidade nos resultados. Solicitei dos meus colegas que, deste material de movimentos dos quais eles dispusessem, retirassem um ou dois oitos para serem trabalhados. Definidas as seqüências particulares, eu pedi que à sua maneira, cada um tentasse nordestinizar o material de que dispunha e se pudessem me descrevessem a estratégia de “nordestinização” da seqüência ao apresentarem-na. O meu interesse era observar como o imaginário de sertão se manifestava para as pessoas nos seus atos cênicos, se estaria presente na dilatação do tempo, ou numa instauração do calor pela expressão facial, ou pelo tolhimento da mobilidade, enfim, eu tinha mais ou menos essas expectativas.
Coisas superinteressantes surgiram; para não me alongar com descrições inócuas particulares destaco alguns pontos chave: o fator agrário esteve presente, em algumas composições, como no caso de Evie, que transformou uma passagem de braços em uma menção ao plantio de algo, e ao uso de terço; para Mayana , por exemplo, a seqüência inicial foi um trecho de Skerzzio de Isadora Duncan composto por saltos e pulos com cabeça e olhares bem definidos e na passagem para a versão exigida, todos os pulos foram retirados e deles só restou a menção dos braços e cabeça, transformada num “estender roupas” ou seja, sua composição de nordeste denotava algo fraco, frágil, pouco, movimentos contido ao extremo e alinhamento postural curvo, linha de olhar baixo sempre, tudo muito “dona-de-casa” e também muito solene, assim como a versão de Maria Paula. Já Joline, Loraine e Joélia reconstruíram suas seqüências em cima do dado festividade, aproveitaram de algum modo a cadência do xaxado e os pulos com uma “alegria pobrinha” de morta fome. Joline, e Carol se aproximaram nos resultados pela descoberta da barriga para dentro, barriga de fome que esculpe os ossos; no caso específico de Carol, ela fez um comentário cultural que aproximou esta barriga da fome das mulheres com a lata de água na cabeça, de olhos apertados por causa do calor e tempo lento e a barriga do glamour anoréxico das topmodels.Houve toda uma construção do corpo a partir desta barriga para cada caso.Na cena de João Miguel, ficou a impressão de um olhar que comanda a cena mais que o movimento em si, o tempo dilatado, um calor excessivo também relacionado com esse tempo descolado da ação. A cena de Victor Hugo trouxe um dado novo, ou pelo menos um lugar de onde se olha novo na cena: exerceu o papel do masculino, do dono do chicote, do alto de seu cavalo, o olhar que como está do alto, tem de se direcionar para o chão, diferente do olhar construído noutras cenas que saía de baixo para cima.

Proposição cênica 2descrição de procedimentos

Ao pensarmos na fotografia como um artefato cultural chave para pensar na construção e midiatização dos papéis sociais e de gênero e deslocarmos esse sentido para as amareladas fotografias de família, tão presentes em qualquer casa, para pensar nas relações de parentesco, e nos mesmos papéis no sertão?
Parti da idéia de fotografia de família para propor que fossem feitas fotos em pequenos grupos atendendo a critérios estabelecidos por cada grupo e que pudéssemos conversar sobre as estratégias espaciais de composição fotográfica familiar. Seguem acima do corpo do texto todas as fotos.

Observações conclusivas ou perguntas-crise para fermentação de novas idéias

1)Sobre a proposição cênica 1: Mas, não somos todos nordestinos? Como estamos acostumados a nos pintar e a nos reconhecer? Como pintar determinadas tradições do Brasil sem falar dessas palmeiras, desses sabiás e desse povo pobre tão alegre? Ou como falar desse lugar deslocando esse sentido sem deixar de fazer parte desta comunidade simbólica Brasil?
2) Como suscitar um estado pessoal de identificação que leve as pessoas de modo claro a acessar subjetividades potencialmente cênicas?
3)Que técnicas, que imagens acessar para fomentar uma produção mais autobiográfica?
4)Como inserir vocalização nos experimentos?
5) Como avaliar a duração das aplicações?
6) Será que formalismo técnico não combina com conteúdos mais engendrados?
7) Como utilizar filmes ou material filmográfico como estratégia de composição em dança?